Diversity Washing e racismo: inquietações que requerem ações imediatas

Redação Ecomunica

29 Novembro 2021
0 Comentários

Você já ouviu falar em Diversity Washing? Em tradução livre significa “lavando a diversidade”, expressão que sintetiza as práticas realizadas por marcas que usam pautas de diversidade e inclusão apenas para gerar lucro e ter mais visibilidade, sem se preocupar verdadeiramente com esses temas.

Um desses assuntos é o racismo. Apesar das pessoas negras constituírem cerca de 54% da população total do Brasil, segundo dados do IBGE, a desigualdade racial em nosso País é gritante. 

Nós não vemos esse dado representado na mídia, dentro de empresas e nas universidades. E, em um momento em que muito se tem falado sobre práticas ESG que envolvem a diversidade e a inclusão, essa é uma discussão urgente para marcas e agências de comunicação. 

Não basta anunciar que apoia a diversidade, nem fazer ações no mês de novembro para celebrar a Consciência Negra, e ignorar a existência desse grupo nos próximos 12 meses. Tampouco devemos recorrer a influencers, pesquisadores e profissionais negros apenas quando o assunto for racismo - suas vivências são plurais, seus conhecimentos possuem amplitude e vão além da opressão racial.

Um reflexo dos tempos 

É, de fato, revoltante termos que falar sobre racismo há tanto tempo, numa sociedade que parece não avançar. Quer ver como situações ocorridas há meio século parecem tão atuais?

Em 1963, a cantora e musicista Nina Simone escreveu “Mississippi Goddam” em apenas uma hora, num rompante de indignação, quando ficou sabendo do bombardeio de uma igreja batista em Birmingham, Alabama. Quatro meninas negras entre 11 e 14 anos morreram nesse atentado. A canção marca o início da militância política da artista e faz referência também ao assassinato do ativista Medgar Evers. Ambos os crimes foram cometidos pela Klu Klux Klan, que atua até hoje, cada vez mais abertamente.

 

Simone, que até então tinha uma carreira sólida cantando standards do jazz, foi adotada como uma das heroínas da luta pelos direitos civis. Ao mesmo tempo, era banida das rádios e das salas de concerto - sua plateia e a indústria, ambas majoritariamente brancas, não se interessavam em entender a origem de uma canção tão desoladora.

Como vemos, infelizmente, esforços como o da cantora continuam necessários, quase 50 anos depois. Eventos mais recentes, como o assassinato de George Floyd, motivaram uma onda de protestos contra brutalidade policial nos Estados Unidos, onde 1.903 pessoas morreram em 2019 nas mãos da polícia (segundo o The Guardian). No Brasil, o número é 5 vezes maior: 5.804 mortes, no mesmo período, equivalente a cerca de 16 mortes por dia. 

 

"Tudo que eu quero é igualdade,

Para minha irmã, meu irmão, meu povo e eu"

Nina Simone, Mississippi Goddam (1963)

 

Vivências de sobra para pouco espaço

Em 2 de junho de 2020, uma terça-feira, a timeline dos americanos (e, por consequência, a nossa também) foi inundada por posts pretos, em apoio à luta do movimento Black Lives Matter (Vidas Negras Importam).

Captura de tela mostra feed de Instagram com posts pretos para o Blackout Tuesday.

"Apagão" nas redes foi feito com boas intenções, mas atrapalhou a mobilização #TheShowMustBeStopped de ativistas para dar voz às pessoas negras.

Mas o curioso é ver como a ideia de postar um “quadradinho preto” nas redes começou cheia de significado e acabou se esvaziando - como acontece, muitas vezes, com várias campanhas e lutas sérias.

A história foi a seguinte: as executivas musicais Jamila Thomas e Brianna Agyemang perceberam a urgência da luta racial e  lançaram a campanha #TheShowMustBePaused, cuja ideia era promover um dia inteiro para refletir formas de apoiar a comunidade negra na indústria. No site da iniciativa, é possível encontrar petições para assinar, fundos para contribuir e diversos materiais para se educar contra o racismo.

Captura de tela de post do perfil @theshowmustbepaused no Instagram. O texto, traduzido, diz: “Nós enxergamos a sua dor. Nós enxergamos a sua frustração. Nós esperamos que hoje, você possa descansar. Nós vemos os seus logos. Nós vemos as suas hashtags. Agora nós queremos ver os seus planos.”

“Nós enxergamos a sua dor. Nós enxergamos a sua frustração. Nós esperamos que hoje, você possa descansar. Nós vemos os seus logos. Nós vemos as suas hashtags. Agora nós queremos ver os seus planos.”

A ideia foi um sucesso e acabou viralizando no Instagram. Mas, à medida em que era replicada, informações sobre a proposta inicial foram se perdendo, numa espécie de telefone sem fio virtual. Logo, a campanha estava erroneamente associada ao movimento Black Lives Matter, a tag fora substituída pela genérica #BlackOutTuesday e o tal quadrado preto se tornou símbolo do movimento. 

A questão é que esse quadrado, muitas vezes publicado sem qualquer texto informando seu significado, dominou o feed da rede social, enquanto postagens educativas sobre o tema se perdiam nos algoritmos. E aquela terça-feira, que deveria evidenciar e amplificar vozes negras, acabou banalizada. 

Como transformar essa indignação em ações reais? 

Para evitar adesões vazias a causas sérias, é preciso se aprofundar nas estratégias de Comunicação para ESG

Ao planejar ações que pautam a diversidade e a inclusão, por exemplo, é interessante encarar as marcas como uma plataforma viabilizadora, para que vozes silenciadas e corpos invisibilizados sejam reconhecidos e prestigiados.

Uma ideia é que pessoas brancas e marcas cedam as suas plataformas e redes sociais ou cocriem conteúdos com pessoas negras, para que elas propaguem suas mensagens e revelem quem elas são para além da opressão que vivenciam. Como Djamila Ribeiro disse para a Folha, “o enfrentamento ao racismo precisa ser mais do que posts para aliviar a consciência”.

Outras propostas, reunidas neste artigo da revista de negócios de Harvard, giram em torno da criação de um ambiente de trabalho seguro e igualitário para pessoas negras. As ações incluem a criação de políticas de tolerância zero à discriminações de qualquer tipo, além da oferta de treinamentos em equidade racial para todos os colaboradores — incluindo o CEO. O investimento nessas iniciativas se converte em uma empresa mais responsável e antenada aos pilares ESG, características de grande valor no mercado atualmente. 

Aqui, na Ecomunica, nós aceitamos o convite que Elza Soares fez em suas redes sociais em junho de 2020, de espalhar uma #ondanegra de aprendizado e empatia, protagonizada por pessoas pretas. Temos muito a evoluir, mas destacar vozes como Nina e Elza, entre outras pensadoras e pensadores, artistas, influenciadoras, influenciadores e anônimos do dia a dia é um esforço mínimo e necessário para viabilizarmos um futuro de menos indignação e mais ação.

Para começar a se educar

Se você ainda está por aqui, acreditamos que é por querer compreender melhor o que é e como alinhar o discurso antirracista da sua marca às práticas ESG, para além de datas importantes para a causa. Acertamos?

Se for o caso, o que acha de conferir a lista com 6 conteúdos sobre diversidade, desigualdade racial e colorismo que os nossos colaboradores que se autodeclaram pretes e pardes cocriaram? É uma oportunidade para emancipar seu próprio aprendizado, por meio de conteúdos criados por pessoas negras e, assim, repercutir vozes que precisam ser ouvidas.

Redação Ecomunica

Somos um time multidisciplinar e intergeracional que acredita no poder transformador da comunicação integrada e fluída. Somos inquietos, comprometidos, transparentes e colaborativos. Para nós, a qualidade gera quantidade e a autenticidade é um dos principais caminhos para a relevância.

Posts recentes